segunda-feira, 16 de novembro de 2009

DISPERSÃO : Mário de Sá Carneiro .

Mário de Sá Carneiro


O POETA QUE FEZ LUZ NA ESCURIDÃO


SOBRE O AUTOR .
Escritor português, natural de Lisboa. A mãe morreu quando Sá-Carneiro tinha apenas dois anos e, em 1894, o pai iniciou uma vida de viagens, deixando o filho com os avós e uma ama na Quinta da Victória, em Camarate. Em 1900, entrou no liceu do Carmo, começando, então, a escrever poesia. Entretanto, o pai, de regresso dos Estados Unidos, levou-o a visitar Paris, a Suíça e a Itália. Em 1905 redigiu e imprimiu O Chinó, jornal satírico da vida escolar, que o pai o impediu de continuar, por considerar a publicação demasiado satírica. Transferido, em 1909, para o Liceu Camões, escreveu, em colaboração com Thomaz Cabreira Júnior (que viria a suicidar-se no ano seguinte), a peça Amizade. Impressionado com a morte do amigo, dedicou-lhe o poema A Um Suicida, 1911. Matriculou-se na Faculdade de Direito de Coimbra em 1911, mas não chegou sequer a concluir o ano. Iniciou, entretanto, a sua amizade com Fernando Pessoa e seguiu para Paris, com o objetivo de estudar Direito na Sorbonne. Na capital francesa dedicou-se sobretudo à vida de boemia dos cafés e salas de espetáculo.Em 1914, publicou A Confissão de Lúcio (novela) e Dispersão (poesia). No ano seguinte, durante uma passagem por Lisboa, começou, conjuntamente com os seus amigos, em especial Fernando Pessoa, a projetar a revista literária que se viria a publicar com o nome de Orpheu.
À revista , cujo primeiro número, saído em Abril de 1915 e imediatamente esgotado, provocou enorme escândalo no meio cultural português. No final do mesmo mês, publicou Céu em Fogo. Em Julho desse ano saiu o Orpheu 2 e, pouco depois, Sá-Carneiro regressou a Paris, de onde escreveu a Fernando Pessoa comunicando a decisão do pai de não subsidiar o número 3 da revista. Agravaram-se, por esta altura, as crises sentimentais e financeiras do poeta (já por várias vezes tinha escrito a Fernando Pessoa comunicando o seu suicídio). Sá-Carneiro suicidou-se, com vários frascos de estricnina, a 26 de Abril de 1916, num Hotel de Nice, suicídio esse descrito por José Araújo, que Mário Sá-Carneiro chamara para testemunhar a sua morte. Deixou a Fernando Pessoa a indicação de publicar a obra que dele houvesse, onde, quando e como melhor lhe parecesse.
Como escritor, Mário de Sá-Carneiro demonstra, na fase inicial da sua obra, influências do decadentismo e até do saudosismo, numa estética do vago, do complexo e do metafísico. Aderiu posteriormente às correntes de vanguarda do paúlismo, do sensacionismo e do interseccionismo, apresentadas por Fernando Pessoa.
O delírio e a confusão dos sentidos, marcas da sua personalidade, sensível ao ponto da alucinação, com reflexos numa imaginação exuberante, definem a sua egolatria, uma procura de exprimir o inconsciente e a dispersão do eu no mundo. Este narcisismo, frustrada a satisfação das suas carências, levou-o a um sentimento de abandono e a uma poesia auto-sarcástica,revendo-se o poeta na imagem de um menino inútil e desajeitado. A sua crise de personalidade, que se traduziu no frenesi da experiência sensorial e no desejo do extravagante, foi a da inadequação e da solidão, da incapacidade de viver e de sentir o que desejava, que o levou a uma tentativa de dissolução do ser, consumada na morte. Foi autor da coletânea de contos Princípio (1912), de que se destaca O Incesto, e do volume póstumo Indícios de Ouro (1937). As suas Cartas a Fernando Pessoa foram reunidas em dois volumes, em 1958 e 1959.

A SUA OBRA - DISPERSÃO
Primeiro livro de poesias de Sá-Carneiro, poeta de dispersão interior, Dispersão revela logo no título a dificuldade de concentração, a pluralidade de opções com que o seu interior se confrontava, anunciando já o termo trágico que daria à sua vida. Contém 12 poemas e é a busca do ideal inacessível, o mundo de sonhos onde o poeta se sente bem. Dispersão e outros como Além-Tédio são poemas significativos da tristeza, exprimem o tédio endurecido e a dor "de ser - quase" que o faz ter saudades da morte. A propósito dos poemas de Dispersão, o poeta não se integra no mundo, o que lhe causa por vezes um sofrimento de morte. Sá-Carneiro seria destruído pela sua poesia e em proveito dela. O dualismo de Sá-Carneiro revela-se também através da oposição, antítese, na definição de si mesmo, na impossibilidade de reconciliação entre o poeta e o mundo, entre a alma e o corpo:Não sou amigo de ninguém. Pra o ser – Forçoso me era antes possuir Quem eu estimasse – ou homem ou mulher, E não logro nunca possuir. Em Mário de Sá-Carneiro tudo é difuso, velado, nevoento, tudo é tarde, crepúsculo, poente, fim de dia, noite, sombras, trevas, numa palavra mistério. Os próprios títulos indicam uma atmosfera nebulosa, mal definida: Intersonho, Vontade de dormir, Dispersão, Quase, Alem- Tédio.
No livro Dispersão ainda se notam vestígios da expressão simbolista. Contudo, é já um livro moderno pela atenção que da ao existencial. Verificamos ao longo do livro o desespero do poeta causado pela dicotomia de não conseguir alcançar o celeste, o divino, o ideal. Assim, a sua alma está nostálgica de além. o desespero de não se adaptar à vida. A busca e a dispersão de si mesmo são a linha de conduta de todo o livro. O poeta, num desabafo desesperante, diz:
• Perdi-me dentro de mim / Porque eu era labirinto, / E hoje, quando me sinto, / E com saudades de mim. A dor sentir-se vivo e o desejo de equilíbrio também estão presentes, assim como o desespero, a profunda tristeza que o levará a dizer: O pobre moço das ânsias... / Tu, sim, tu eras alguém! / E foi por isso também / Que te abismaste nas ânsias.Na essência da sua poesia surge a busca do seu ideal de poeta, a renuncia que dele exige. Tudo constitui um mundo de dúvidas, de ânsias, de angustias. A poesia de Sá-Carneiro nasceu madura, na plena posse dos seus recursos, na luz da escuridão.
A obra de Mário Sá-Carneiro está intimamente relacionada a sua vivência pessoal, ou seja, revela toda a sua inadaptação ao mundo e a constante busca do seu próprio eu. Isso faz com que o poeta mergulhe no seu mundo interior e, diferente de Fernando Pessoa, que se desdobrou em heterônimos, atinja a autodestruição. Para o bom entendimento da obra de Mário de Sá Carneiro é necessária a análise das "Cartas a Fernando Pessoa", publicadas postumamente, onde o autor deixa claro toda a angustia que sentia .
É um dos nossos maiores poetas do Modernismo, talvez o que melhor exprime a angustia de não saber quem é, e o que isso reflete em seu modo de vida e de percepção do mundo a sua volta, ora com decepção ao jeito simbolista, ora inebriada pelas sensações e entusiasmos do futurismo.Exprimia em suas obras quem realmente era: um menino perdido, que não se encontra no mundo em que vive, e assim confuso e perdido, desesperasse .
A sua poética afasta-se de uma preocupação meramente formal da experiência literária, centrando nela embora o seu discurso, mas nela fundamentando as interrogações e a afirmação de anseios que dão sentido a uma existência que, no entanto as não encontram.

ALGUNS POEMAS QUE REVELAM A SUA PROFUNDA MELANCOLIA


ESCAVAÇÃO

Numa ânsia de ter alguma cousa,
Divago por mim mesmo a procurar ,
Desço-me todo, em vão, sem nada achar,
E a minh’alma perdida não repousa.
Nada tenho, decido-me a criar:
Brando a espada: sou luz harmoniosa
E chama genial que tudo ousa
Unicamente a força de sonhar ...
Mas a vitória fulva esvai-se logo...
E as cinzas, cinzas só,em vez de fogo...
-Onde existo que não existo em mim?
Um cemitério falso sem ossadas
Noites d’amor sem bocas esmagadas
Tudo outro espamo que principio ou fim .

ALCOOL

Guilhotinas, pelouros e castelos
Resvalam longamente em procissão;
Volteiam-me crepúsculos amarelos ,
Mordidos , doentios de roxidão.
Batem asas de auréola aos meus ouvidos,
Grifam-me sons de cor e de perfumes,
Ferem-me os olhos turbilhões de gumes,
Descem-me a alma,sangram-me os sentidos
Respiro-me no ar que ao longe vem,
Da luz que me ilumina participo ,
Quero reunir-me, e todo me dissipo-
Luto, estrebucho...em vão! Silvo pra além ...
Corro em volta de mim sem me encontrar ...
Tudo oscila e se abate como espuma...
Um disco de ouro surge a voltear...
Fecho os meus olhos com pavor da bruma...
Que droga foi essa que me inoculei?
Ópio de inferno em vez de paraíso?...
Que sortilégio a mim próprio lancei?
Como é que em dor genial eu me eterizo?
Nem ópio nem morfina.O que me ardeu,
Foi alcool mais raro e penetrante:
É só de mim que ando delirante –
Manhã tão forte que me anoiteceu.

E sua obra mais famosa :
Dispersão
•Perdi-me dentro de mim
Porque eu era labirinto,
E hoje, quando me sinto,
É com saudades de mim.
Passei pela minha vida
Um astro doido a sonhar.
Na ânsia de ultrapassar,
Nem dei pela minha vida...
Para mim é sempre ontem,
Não tenho amanhã nem hoje:
O tempo que aos outros foge
Cai sobre mim feito ontem.
O Domingo de Paris
Lembra-me o desaparecido
Que sentia comovido
Os Domingos de Paris:
Porque um domingo é família,
É bem-estar, é singeleza,
E os que olham a beleza
Não têm bem-estar nem família
O pobre moço das ânsias... tu, sim, tu eras alguém!
E foi por isso também
Que te abismaste nas ânsias.
A grande ave dourada
Bateu asas para os céus,
Mas fechou-as saciada
Ao ver que ganhava os céus.
Como se chora um amante,
Assim me choro a mim mesmo:
Eu fui amante inconstante
Que se traiu a si mesmo.
Não sinto o espaço que encerro
Nem as linhas que projeto:
Se me olho a um espelho, erro —
Não me acho no que projeto.
Regresso dentro de mim
Mas nada me fala, nada!
Tenho a alma amortalhada,
Sequinha, dentro de mim.
Não perdi a minha alma,
Fiquei com ela, perdida.
Assim eu choro, da vida,
A morte da minha alma.
Saudosamente recordo
Uma gentil companheira
Que na minha vida inteira
Eu nunca vi...
Mas recordo
A sua boca doirada
E o seu corpo esmaecido,
Em um hálito perdido
Que vem na tarde doirada.
As minhas grandes saudades
São do que nunca enlacei.
Ai, como eu tenho saudades
Dos sonhos que não sonhei!...
E sinto que a minha morte —
Minha dispersão total —
Existe lá longe, ao norte,
Numa grande capital.
Vejo o meu último dia Pintado em rolos de fumo,
E todo azul-de-agonia
Em sombra e além me sumo.
Ternura feita saudade,
Eu beijo as minhas mãos brancas...
Sou amor e piedade
Em face dessas mãos brancas...
Tristes mãos longas e lindas
Que eram feitas
Pra se dar
Ninguém mas quis apertar
Tristes mãos longas e lindas
Eu tenho pena de mim,
Pobre menino ideal...
Que me faltou afinal?
Um elo? Um rastro?... Ai de mim!...
Desceu-me na alma o crepúsculo;
Eu fui alguém que passou.
Serei, mas já não me sou;
Não vivo, durmo o crepúsculo.
Álcool dum sono outonal
Me penetrou vagamente
A difundir-me dormente
Em urna bruma outonal.
Perdi a morte e a vida,
E, louco, não enlouqueço...
A hora foge vivida,
Eu sigo-a, mas permaneço,
.....................................
Castelos desmantelados,
Leões alados sem juba
......................................

REFLEXÃO

"Que me faltou afinal?" "Onde existo se não em mim ?"
"Corro em volta de mim sem me encontar ?"
O que falta a cada um de nós, para sermos realmente felizes ? Acredito que mais AMOR. O amor de hoje, não o de amanhã , nem o de ontem , o sentimento vivo de agora, pois como disse nosso grande poeta Renato Russo : "É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã, por que se você parar prá pensar na verdade não há..." .
VIVA o HOJE
VIVA FELIZ agora
AME ...
Expluse a melancolia do seu coração e deixe que a luz aflore, seja um poeta completo, feliz ...
Encontre seu lugar no mundo ...



e nunca se esqueça é que é preciso recolher os pedações dispersos e se reconstruir a cada dia novo, melhor , mais feliz ....
Nasça sempre com as manhãs
como o dia... que nasce novo em cada amanhecer ....
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3 comentários:

  1. Nesses slides passam algumas imagens do que a obra Dispersão, de Mário de Sá Carneiro transmitiu ao grupo .
    Bianca Macedo;Géssica Gonçalvez,Larissa Costa e Leticia Costa .

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  2. Ótimos poemas. Podiam deixar a análise do poema escavação. Obrigada

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